Escrito por: Thalita Martins
No último domingo, dia 12 de setembro de 2021, Scenes from a Marriage estreou na HBO. Dirigida por Hagai Levi (ninguém menos que o escritor de The Affair) e protagonizada por Jessica Chastain (eu a conheci em Interestelar), interpretando a Mira, e Oscar Isaac (Ex_machina: Instinto Artifical e Star Wars: O Despertar da Força), interpretando o Jonathan, a série é uma adaptação contemporânea de um clássico sueco de mesmo nome criado por Igmar Bergman em 1973. Segundo o IMDb a minissérie terá 5 episódios, mas não me surpreenderia se renovassem, nos tempos atuais não temos certeza que uma minissérie continuará sendo minissérie.
Quem viu The Affair sabe o potencial que o Hagai tem para explorar perspectivas e contar a mesma história de diferentes ângulos, a riqueza de detalhes é chocante. Seja escrevendo ou dirigindo, ao ver o nome dele envolvido na obra não pude evitar ter minhas expectativas em alta. Sim, a série é potente. Se você é fã da obra original, me perdoe por não poder citá-la enquanto escrevo minhas impressões, pois não a assisti. Focarei, dessa forma, apenas na versão de 2021.
Eu sou uma GRANDE FÃ de drama e fico totalmente maravilhada como esse gênero consegue ir tão fundo no existencialismo humano. Quase 60 minutos de pessoas conversando que mais pareceram 20. A começar pela cena inicial que brincou com o nosso discernimento. Estamos literalmente vendo cenas sobre um matrimônio. Ao colocar a Mira em um set se preparando para “filmar”, a intenção foi fazer um paralelo “engraçado” com o título da série, ou nos dar pistas que a percepção da personagem sobre o casamento é diferente daquela mantida pelo seu cônjuge? Afinal, ela estava sozinha quando começou o take. Estaria, então, abrindo mão dela mesma de alguma forma? Amo essa ambivalência artística de ser totalmente subjetiva ao mesmo tempo em que não é. Isso nos permite senti-la e estudá-la.
Ao que me parece, a Mira e o Jonathan se encontraram em momentos sombrios da vida para ambos, o que fica extremamente implícito – ou levemente explícito – durante a cena com a pesquisadora que os entrevistava nos minutos iniciais do episódio (essa cena é muito sutil, mas esclarecedora!). Para Mira, o Jonathan era alguém diferente do que ela estava acostumada, alguém que a ajudou a sair do ciclo de relacionamentos abusivos aos quais se encontrava presa. Para Jonathan, a Mira era alguém que o ajudava a se conectar com o mundo fora da ortodoxia em qual foi criado, ortodoxia essa da qual ele havia acabado de abandonar, o que acarretou uma inteira mudança em sua perspectiva de mundo. Ambos pareciam um meio certo para se sentirem mais seguros.
A pesquisadora pergunta para ambos a forma que eles se definem e o curioso é que o Jonathan cita ser um acadêmico, um pai, um judeu, um asmático, mas não cita ser um marido. A Mira, por outro lado, se coloca como uma esposa. Quando eles descrevem o início do relacionamento citam diversos contextos: se conheceram na faculdade, eram de mundos diferentes, dividiram um apartamento... mas não sabiam exatamente onde havia começado a história dos dois. Nem citaram sentimentos que nutriram um pelo outro àquela altura.
Preciso destacar a maestria da série ao tratar do protagonismo financeiro da Mira e sua carga de trabalho superior ao do Jonathan. Sem verbalizar, a personagem mostrou a culpa que sente por ser mais ausente que o marido na criação da filha e por “fazer mais dinheiro”, quando o contrário seria totalmente aceitável. A tentativa de justificativa da Mira ao surgir o assunto é urgente, apesar de não desesperada, o que nos leva a presumir que ela já foi julgada antes por estar menos em casa que o esposo. Foram alguns momentos em que eu fiquei extremamente desconfortável e a série fez isso com pouquíssimos elementos.
Durante a entrevista, o Jonathan se coloca à frente e diversas vezes responde pela sua esposa (pretends to be shocked), mas o que realmente me deixou atenta começou a partir do minuto 16:00, onde a Mira, ao ficar sozinha com a entrevistadora, apresentou uma mudança sutil em seu comportamento, o que junto com outros elementos citados acima reforçam minha tese de que ela realmente abre mão de parte de si durante a convivência com o marido.
A série funciona quase como um puzzle onde você precisa pescar algumas pistas para entender os contextos. O detalhe do foco na taça de vinho no jantar, por exemplo, em que eu sabia que poderia esperar algo dali, mas não sabia exatamente o que. Acredito que o mais notável na narrativa é que ela não se trata de um casamento infeliz e problemático, mas apenas um matrimônio que não tem felicidade suficiente. As indagações do Jonathan sobre o significado de “sucesso” deixa clara a hesitação do personagem sobre seu matrimônio – inclusive gostaria de destacar a pertinência daquelas palavras, foram no ponto.
Os diálogos são tão intensos porque são muito reais. Eu ainda fico perplexa com a capacidade desses atores e atrizes em transparecer algo tão genuíno que nos permite imergir de uma forma tão exagerada que é difícil até conceber que tudo aquilo é atuação. Talvez tenha muito da vida deles mesmos ali. Hoje em dia eu acredito que atuar é uma das maiores exposições que alguém faz da própria vida. Bem, eu com certeza irei continuar. A HBO me obriga a continuar falando bem dela, o que posso fazer? Apenas aclamar.
Nota que dei no BdS: 9.0
Parabéns pela review.
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Texto 10/10 < 3
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que review maravilhosa amiga, só deu mais vontade de assistir < 3 parabéns!!
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Esse texto é uma obra de arte, tal qual a série!
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a eficienciaaaaa dessa equipe 💖
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Colocou em palavras toda a minha experiência com esse piloto. Amei Thalita e espero ler outros comentários feitos por você
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